Adolescentes, ovelhas mutantes e comédia com o idioma
Análises rápidas sobre Adolescência, Lamb e O Céu da Língua, além de uma miniminicrônica falando de como mostrei Brilho Eterno para meu filho
O QUE VI
Adolescência – Não esperava que iria entrar no hype da grande sensação produzida pela Netflix. Até me interessei quando o algoritmo me anunciou o lançamento, mas estava ocupado demais com um trabalho puxado e sequer tive tempo de propor à esposa de vermos juntos. Até que a série pulou pro topo das mais vistas, todo mundo começou a comentar ao meu redor e surgiram reportagens, newsletters e podcasts sobre ela e/ou seu tema. Para quem não sabe, a produção mostra a detenção de um garoto de 13 anos acusado de assassinar uma colega de escola. A história passa por misoginia, incels, bullying, nudes adolescentes, emojis em códigos em redes sociais e todo um universo que muitos pais desconhecem e nem desconfiam que seus filhos possam estar inseridos. Além do assunto chamar muito a atenção, a produção inglesa usou um único plano sequência (uma tomada de câmera sem cortes) em cada um dos quatro episódios. Foi tanto elogio que minha esposa até veio me perguntar se eu estava sabendo da série. Disse que sim e que ia tentar ver pelo menos o primeiro episódio na noite de sexta, para incluir aqui na newsletter, que eu esperava publicar no sábado. Mas Adolescência é mesmo impressionante, e acabamos vendo tudo em três dias, o que pra mim, não adepto de emendar um episódio no outro, já configura maratona. Sendo sincero, primeiro eu queria ver só pra estar por dentro do assunto do momento, o que me deixou até um pouco irritado. Só que valeu muito a pena. Recomendo sim. Ainda mais se vocês tiver um filho adolescente.
Lamb – Aproveitando meus últimos dias na Mubi, fui conferir este filme islandês que botei na minha lista assim que assinei a plataforma. Tinha outros na minha seleção, mas na semana passada, nas gravações do programa em que estou trabalhando, entrei num papo sobre filmes e séries desconhecidas e uma fotógrafa falou de Lamb. Perguntei se era o tal do casal que encontra uma ovelha humana e ela confirmou. Então fui nesse, porque teria alguém com quem debater depois. Isso porque achei que não ia convencer minha esposa a assistir também. Jurei pra ela que era só “fantasia”, embora estivesse achando que teria algo de terror no meio. E até que tem, acho, mas muito pouco. O filme é muito interessante, construindo um clima envolvente mesmo sem muita trama se desenrolando. Até que chega o fim e... putz. Nada a ver. Esquisito demais, não deixa lição, não deixa mensagem, não resolve a vida dos personagens, não dá calorzinho no coração e nem nos deixa com algum pensamento crítico. Minha esposa ficou com a mesma opinião. Corri atrás das críticas e a maioria apontava o desfecho como ponto fraco. Não vou dizer que me arrependi de ver, mas não tenho convicção para recomendar.
Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças – Sempre fui fascinado por dois filmes, um totalmente blockbuster e outro com um pezinho no artístico. E filmes especiais a gente precisa compartilhar, ainda mais quando temos filhos que curtem cinema. Quando o meu garoto tinha uns 12 anos, me precipitei e apresentei Matrix para ele. Na verdade, mostrei a trilogia toda (ainda não existia o quarto filme, e ainda acho que não existe), que tenho em DVD. Percebi o quanto não sacou nada do que o filme significava pra mim quando ele disse que preferiu o terceiro da saga. Claro que ele não ia pensar em simulacros da realidade, alegoria da caverna e teoria da simulação. Ele não ia querer ler Baudrillard ao fim da sessão. Então prometi a mim mesmo que só apresentaria Brilho Eterno quando ele tivesse uma desilusão amorosa. Ele já está com 19 anos e o filme sairia da acervo da Netflix no meio de março. Não vou dizer que estava torcendo para seu namoro dar errado antes daquele prazo. Mas fiquei atento. Até que um dia ele chegou em casa triste, porque teve uma DR que lhe abriu a cabeça para a possibilidade de um fim no relacionamento. Conversamos muito e falei que havia chegado a hora de ver o filme do Charlie Kaufman dirigido por Michel Gondry. Revendo 20 anos depois, continuei achando emocionante, engenhoso e engraçado. Meu filho também gostou, ficou elogiando o roteiro várias vezes. Missão cumprida. Mas quando perguntei se tinha virado seu filme favorito, ele negou. Continua sendo Asas do Desejo, de Wim Wenders, que ainda não vi e que agora ele quer que vejamos juntos. Acho que não vale citar Cidade dos Anjos como motivo para não assistir ao preferido do rapaz.
O Céu da Língua – Fui conferir o espetáculo escrito e interpretado por Gregório Duvivier em seu último dia de turnê carioca. Sim, saiu de cartaz. Mas vale citar aqui como serviço, porque a peça vai pegar a estrada, e quem mora fora do Rio precisa se informar ou fazer abaixo-assinado para levar a produção às suas cidades. Na estreia, antes do Carnaval, alguns amigos foram ver e elogiaram muito. Na mesma hora fiquei interessado, não apenas porque sou grande fã do Greg (e minha estreia como roteirista foi escrevendo um personagem que ele interpretava na TV), mas também porque humor sobre nosso idioma é muito minha praia. Fiquei achando que seria estranho um monólogo inteiro sobre o tema, imaginando algo paradão, quase um standup. Fui surpreendido com uma produção teatral das boas, com uma direção espertíssima da atriz Luciana Paz, que não o deixa sozinho no palco. Grande sacada. Recomendo muitíssimo.
O QUE OUVI
Fio da Meada: Vanessa Cavalieri não quer prender o teu filho – Já que falamos de Adolescência, vale muito citar essa edição que foi lançada três dias antes de a série estrear. Timing maior, impossível. Se bem que está mais pra zeitgeist. O podcast da Rádio Novelo trouxe para um papo a juíza titular da Vara da Infância e Juventude do Rio de Janeiro, que traça um panorama assustador sobre a mudança no perfil dos infratores que estão chegando a ela. Disparou o número de jovens de classe média e alta cometendo infrações no mundo digital. Ela fala sobre a necessidade de controle dos pais na vida online dos adolescentes, da mesma forma que fazemos no mundo físico. O podcast Café da Manhã também conectou a juíza à série, em uma entrevista num episódio desta semana, mas não consegui ouvir porque aparentemente a Folha de S. Paulo está bloquando para quem não é assinante do jornal (alguém me confirma isso?).
CHEGANDO AO FIM DE MAIS UMA EDIÇÃO NOVAMENTE COM UM PEDIDO DE DESCULPAS. MAS REALMENTE ESTÁ IMPOSSÍVEL LANÇAR NOS DIAS HABITUAIS (QUINTA OU SEXTA) POR CONTA DA GRAVAÇÃO EM QUE ESTOU TRABALHANDO. DESTA VEZ NEM NO SÁBADO DEU PARA ESCREVER, PORQUE PRECISEI REESCREVER UM ROTEIRO CORRENDO NO FIM DE SEMANA. MAS PELO MENOS CUMPRI NOSSO ACORDO DE PUBLICAR TODA SEMANA. BOM, TECNICAMENTE, DOMINGO JÁ É OUTRA SEMANA. MAS SE VOCÊ VIER ME FALAR ISSO, JÁ TE JOGO NO MEU TEXTO ANTERIOR, NO QUAL ENUMERO PISTAS SOBRE UM CIDADÃO SER BABACA COM PEQUENAS BRINCADEIRAS OU OBSERVAÇÕES DO DIA A DIA. ESTÁ AQUI O LINK PARA VOCÊ FAZER O AUTOTESTE! BOM RESTINHO DE FIM DE SEMANA (MELHOR JÁ DESEJAR UMA BOA SEMANA INTEIRA PRA TODOS NÉ?) E ESPERO QUE O TEXTO SEJA ÚTIL.
Acho que Adolescência deve ser mesmo tão boa quanto dizem, mas como sempre me descrevem como um "soco no estômago", e não sei se estou a fim de ser agredido neste momento, tenho adiado esse encontro.
ainda não cheguei no hype da adolescência. sou muito devagar para séries…